quinta-feira, 24 de março de 2011

Tempos de Augusto dos Anjos...

O sincretismo da obra de Augusto de Carvalho Rodrigues dos Anjos, poeta pré-modernista, combina características (na forma) parnasianas e simbolistas. A angústia, a morbidez, um pessimismo amargo e a descrença no amor são marcas da sua obra. Teria sido influenciado por Arthur Schopenhauer? Ou pelo Niilismo Nietzscheano? Ou as duas coisas juntas? 


Ai! Um urubu pousou na minha sorte."

"Falas de amor, e eu ouço tudo e calo! 
O amor na Humanidade é uma mentira. 

É. E é por isso que na minha lira 
De amores fúteis poucas vezes falo."


"Não sou capaz de amar mulher alguma
Nem há mulher talvez capaz de amar-me.
O amor tem favos e tem caldos quentes
E ao mesmo tempo que faz bem, faz mal;"

"Tome, doutor, essa tesoura e corte/ Minha singularíssima pessoa"
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Versos Íntimos

Vês! Ninguém assistiu ao formidável
Enterro de tua última quimera.
Somente a Ingratidão - esta pantera -
Foi tua companheira inseparável!

Acostuma-te à lama que te espera!

O Homem, que, nesta terra miserável,
Mora, entre feras, sente inevitável
Necessidade de também ser fera.


Toma um fósforo. Acende teu cigarro!
O beijo, amigo, é a véspera do escarro,
A mão que afaga é a mesma que apedreja.

Se a alguém causa inda pena a tua chaga,
Apedreja essa mão vil que te afaga,
Escarra nessa boca que te beija!

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 Psicologia de um vencido

Eu, filho do carbono e do amoníaco,
Monstro de escuridão e rutilância,
Sofro, desde a epigênese da infância,
A influência má dos signos do zodíaco.

Profundissimamente hipocondríaco,
Este ambiente me causa repugnância...
Sobe-me à boca uma ânsia análoga à ânsia
Que se escapa da boca de um cardíaco.

Já o verme - este operário das ruínas -
Que o sangue podre das carnificinas
Come, e à vida em geral declara guerra,

Anda a espreitar meus olhos para roê-los,
E há de deixar-me apenas os cabelos,
Na frialdade inorgânica da terra!

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